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Embrião de um futuro quartel-general de operações da UE (QGO) de um Exército Europeu?

O Tratado de Maastricht, assinado em 7 de fevereiro de 1992, criou uma União Europeia (UE) assente em três pilares, sendo o segundo pilar dedicado à Política Externa e de Segurança Comum (PESC), com o objetivo de reforçar a segurança da UE e dos seus Estados-membros e de promover paz e segurança internacional, em consonância com os princípios da Carta das Nações Unidas.
Para o efeito, o Artº 24º do Tratado de Maastricht estabelece que “a competência da UE em matéria de política externa e de segurança comum abrange todos os domínios da política externa, bem como todas as questões relativas à segurança da União, incluindo a definição gradual de uma política comum de defesa que poderá conduzir a uma defesa comum ”.
Os trágicos acontecimentos e atrocidades aos direitos humanos verificados nos Balcãs após o desmoronamento e desmembramento da ex-Jugoslávia, demonstraram à saciedade a incapacidade militar da UE para estabilizar e impor a paz em crises e conflitos no seio da própria Europa, redundando em desprestígio e descredibilização da recém-criada PESC. O recurso à NATO para resolução de um conflito interno europeu foi então a solução imediata encontrada.
Ficou suficiente e lamentavelmente demonstrada a tese há muito defendida por estrategos e politólogos de que, no ambiente geopolítico atual, uma política externa e de segurança, para ser minimamente credível, necessita de assentar numa política de segurança e defesa forte que garanta à União uma capacidade operacional apoiada em meios civis e militares. Esta condição necessária foi apenas modestamente abordada no Tratado de Maastricht, principalmente por razões fundamentalistas quanto á interpretação do conceito de soberania dos Estados-membros.
Contudo, o conflito no Kosovo, no verão de 1998, evidenciou a necessidade urgente de dotar a UE de uma política de segurança e defesa que, de forma credível, constituísse “o braço armado” como parte integrante da PESC.
Nesse sentido, a cimeira franco-britânica de Saint Malo, em 4 de dezembro de 1998, faz agora 20 anos, poderá ser considerada como o começo de uma “revolução” ou o ponto de inflexão importante para o desenvolvimento de uma entidade europeia de segurança e defesa. De facto, nessa cimeira ficou acordada a “necessidade de dotar a UE de uma capacidade para desenvolver uma ação autónoma, apoiada por forças credíveis, os meios para decidir usá-las, e a prontidão para a sua concretização em resposta a crises internacionais” .
Trata-se na verdade de um alcance histórico, quase-revolucionário, por ser a primeira vez que o Reino Unido (RU) aceita debater, de modo construtivo, a política de segurança e defesa ao nível europeu. Desengane-se quem pensar que esta declaração se enquadra na afirmação antiamericana de uma emancipação da política da defesa europeia. Pelo contrário, ela pode ser lida (e certamente, pelos olhos britânicos, assim foi) como conducente ao reforço da cooperação transatlântica, garantindo o esforço complementar europeu com a presença americana, então em dúvida devido a questões orçamentais (era Clinton).
Por isso é que, na interpretação britânica desse acordo, é concedida a prioridade à NATO e só quando esta, como um todo, não estiver envolvida, é que a UE poderia contemplar uma opção militar. Escusado será dizer que a interpretação francesa desse mesmo acordo, sublinha e dá maior relevância à importância da capacidade de decisão autónoma da UE para o lançamento de uma operação militar de gestão de crises. Estas duas interpretações digladiaram-se ao longo do tempo, não tendo havido acordo quanto à necessidade de criação de um verdadeiro quartel-general operacional (QGO) para o planeamento e conduta das operações militares lançadas autonomamente pela UE.
Na sequência destes desenvolvimentos, a Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD) foi formalmente estabelecida no Conselho Europeu de Colónia, em 3-4 de junho de 1999 . Os Conselhos Europeus de Helsínquia (10-11dez1999) , Santa Maria da Feira (19-20jun2000) e Nice (7-10dez2000) consolidaram a nova estrutura da PCSD, como parte integrante e garante da capacidade operacional da PESC, e estabeleceram, no quadro institucional da UE, novas estruturas político-militares .
A PCSD provou ser um instrumento eficaz na coerência do conjunto das ações externas da UE, no quadro da Estratégia Europeia de Segurança (2003), e demonstrou a necessidade de se fortalecerem os laços e sinergias entre segurança e desenvolvimento (reforço da segurança/incremento do desenvolvimento).
A discussão sobre a necessidade (ou não) do estabelecimento de uma estrutura permanente de comando e controlo militar da UE, de nível operacional, vulgarmente conhecida por quartel-general de operações (QGO), tem sido recorrente ao longo dos anos, pelo menos desde que, em 2003, o chamado “clube do chocolate” , reunido em Tervuren (Bruxelas), viu liminarmente rejeitada pelo Reino Unido a sua proposta de criação de uma tal estrutura, para o exercício autónomo e eficaz do planeamento e condução das operações militares da UE.
Como já acima se referiu, este debate remonta aos primórdios da PCSD, como parte integrante da PESC. Na realidade, o debate iniciou-se com a cimeira de Saint-Malo quando os chefes de estado e de governo da França e do Reino Unido reconheceram a urgente necessidade de pôr em prática e dar realidade à PESC, segundo as provisões do Tratado de Amesterdão (1997), no sentido de dotar a UE de uma capacidade militar própria e autónoma e de uma componente operacional militar eficaz e credível, para agir internacionalmente em cenários e situações de crise.
De facto, por um lado, o Reino Unido, sem prejuízo da capacidade de decisão autónoma da UE, pôs sempre o acento tónico na necessidade do desenvolvimento de capacidades europeias em perfeita coordenação, complementaridade, transparência, reforço mútuo e sem duplicações desnecessárias com a NATO, que continua a constituir a base da defesa coletiva dos Estados-membros que dela fazem parte . Por outro lado, para a França, aceitando o princípio da complementaridade com a NATO, tal capacidade tem sido sempre interpretada como devendo ser baseada e suportada por forças militares e estruturas de apoio credíveis e da prontidão dos meios indispensáveis para decidir o seu uso de forma autónoma, incluindo uma estrutura permanente de comando e controlo de nível operacional.
Contudo, o princípio e o conceito de complementaridade e reforço mútuo com a NATO nunca foram devidamente clarificados, pelo que a sua interpretação é deixada ao critério dos Estados-membros.
Mas o que importa realçar do ponto de vista político é que, na visão de Londres, para assegurar a indispensável ligação transparente e complementar à NATO e evitar duplicações desnecessárias, essa omissão foi deliberada e consciente. É, pois, um facto que, para o Reino Unido, a UE necessitaria de recorrer sempre a adequados meios e capacidades militares externas, tanto da NATO como pré-existentes nos Estados-membros.
Ora, segundo a doutrina militar vigente, é indispensável a existência de uma estrutura de comando e controlo operacional adequada (QGO), de nível estratégico-operacional, para um planeamento e condução eficaz e credível das operações militares lançadas e conduzidas pela UE, no caminho para a “definição progressiva de uma política de defesa comum, que poderá conduzir a uma defesa comum”. Neste sentido, o facto de tal estrutura permanente ter ficado omissa na arquitetura institucional da PCSD, é, reconhecida e insofismavelmente, uma debilidade do sistema.
Não obstante a supracitada debilidade institucional presente desde a criação da PCSD, a UE, mantendo a sua autonomia de decisão política, já lançou e conduziu até ao momento, em três continentes, 34 missões e operações civis (21) e militares (13), nas quais foram destacadas mais de 80.000 pessoas.
Na ausência de um QGO da UE para o exercício do planeamento operacional e condução das operações militares, a UE recorreu inicialmente aos meios e capacidades da NATO, ao abrigo do Acordo Berlim Plus e, posteriormente, aos 5 QGO nacionais disponibilizados para o efeito .
À medida que a UE se foi tornando um fornecedor ativo e credível de segurança na cena internacional, face à persistente oposição do RU quanto à edificação de um QGO, e à dificuldade crescente de recurso aos meios e capacidades da NATO, a questão da necessidade de uma capacidade de planeamento operacional e de comando e controlo das operações lançadas autonomamente pela UE passou a estar na agenda do Conselho.
Assim, em 17 de dezembro de 2004, o Conselho Europeu homologou a criação de um Centro de Operações da UE (EU Ops Centre), existente junto do Estado–Maior da União Europeia (EMUE), que integra uma célula civil-militar, em Bruxelas. Este Centro de Operações, a ativar por decisão do Conselho, apesar de não se tratar de uma estrutura de comando permanente, poderia, no entanto, constituir mais uma opção à disposição da UE para a condução de operações autónomas. Este Centro de Operações atingiu a capacidade operacional plena (Full Operational Capability-FOC) em 1 de janeiro de 2007, mas nunca viria a ser ativado até 2012 .
De facto, só em 2012, por decisão do Conselho , o Centro de Operações foi ativado com uma dotação total de 89 militares e civis provenientes do EMUE e dos Estados-membros (seconded national experts), para facilitar as trocas de informação, melhorar a coordenação e reforçar as sinergias civis/militares em relação às missões e operações da PCSD em curso no Corno de África, sem prejuízo das cadeias de comando civis e militares já anteriormente estabelecidas para essas mesmas missões/operações .
A Estratégia Global da UE, de junho de 2016, definiu como nível de ambição política o objetivo fundamental de alcançar a autonomia estratégica da UE, com base em forças e capacidades militares de amplo espectro e alta intensidade, capazes de enfrentar as novas ameaças e desafios com maior eficácia, de responder a crises e conflitos externos na sua periferia estratégica e de proteger a UE e os seus cidadãos. Estes novos objetivos políticos, para serem realistas, torna a necessidade de um QGO permanente da UE muito mais premente e urgente .
A coincidência temporal da aprovação da Estratégia Global da UE (junho2016) com o referendo no RU que conduziu ao “Brexit” , permitiu acelerar o processo de revisão e reforço das estruturas e capacidades para planeamento e conduta das operações militares no quadro da PCSD.
Neste sentido, no seguimento da implementação da Estratégia Global da UE nas dimensões de segurança e defesa, aprovado no Conselho de 14-15 de novembro de 2016, foi criada, em junho de 2017, uma nova estrutura de nível estratégico-militar, no seio do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE), fazendo parte do EMUE, designada por Capacidade de Planeamento e Conduta Militar (MPCC) , que fornecerá uma capacidade permanente de planeamento e conduta de nível estratégico-militar para as missões militares não-executivas (treino, aconselhamento, reforma do setor de segurança) .
Esta nova estrutura é dirigida pelo diretor do EMUE e tem um reduzido quadro de pessoal de 30 pessoas provenientes do EMUE e do Centro de Operações UE, incluindo 10 elementos nacionais destacados (seconded national experts) . No que se refere à fase de planeamento, o MPCC elaborará o Conceito de Operações (CONOPS) e o Plano de Operações (OPLAN), assim como as regras de empenhamento (ROE), e contribuirá ainda para o processo sempre complexo e demorado de geração de forças . A coordenação civil-militar entre o MPCC e o CPCC é assegurada por uma pequena célula de apoio e coordenação designada “Joint Support Coordination Cell”. O diretor do MPCC desempenha também a função de interlocutor privilegiado junto do Mecanismo Athena (presentemente em revisão profunda), para o financiamento das atividades militares consideradas comuns, o que torna mais expedito todo o importante processo logístico como transporte tático, apoio sanitário, “procurement” de material, comunicações e imagens por satélite, etc.
Na sequência de um Relatório apresentado pela Alta Representante sobre o impacto do funcionamento e lições aprendidas com o estabelecimento do MPCC, o Conselho de 19 de novembro de 2018 , sublinhou a importante contribuição do MPCC no que se refere à possibilidade de a UE reagir de forma mais rápida e eficaz como fornecedor de segurança, no quadro do conceito “comprehensive approach”, como parte de uma abordagem integrada às crises e conflitos externos.
Nesse Conselho, foi ainda decidido integrar no MPCC as atuais tarefas do Centro de Operações UE, com o objetivo de, no fim de 2020, tomar a responsabilidade pelo planeamento operacional e conduta de novas operações militares não-executivas conduzidas no quadro da PCSD, incluindo uma operação militar executiva da dimensão de um Agrupamento Tático (Battlegroup – BG). Concomitantemente, foi ainda decidido que o MPCC será guarnecido, de forma progressiva, atempada e suficiente, com as infraestruturas e os recursos humanos necessários (devidamente treinados e exercitados), tendo em vista atingir a capacidade operacional plena (FOC) no fim de 2020. O reforço das capacidades do MPCC será complementar e sem prejuízo de todas as outras opções externas disponíveis de comando e controlo, para planeamento e condução de uma operação militar PCSD.
Sublinha-se que, pela primeira vez na história da PCSD, a UE se prepara, de forma paulatina, com recursos humanos e infraestruturas adequados ao exercício pleno, a partir do fim de 2020, do planeamento operacional e do comando e controlo, de nível estratégico-militar e operacional, de operações militares executivas no quadro da PCSD, sem necessidade de recurso a um QGO externo, seja da NATO ou nacional.
O significado político a retirar das decisões deste já famoso Conselho de 19 de novembro, é que, ultrapassadas as “linhas vermelhas” do RU com o Brexit, os Estados-membros reconhecem a necessidade e se dispõem finalmente a progredir no sentido da criação progressiva de um QGO/UE. Neste contexto, as decisões agora tomadas dão legitimidade a que se possa afirmar estarmos efetivamente perante o embrião de um futuro QGO/UE.
Não será, por certo, só por mera coincidência, que esta famosa decisão do Conselho de novembro de 2018, é tomada na mesma altura em que o eixo franco-alemão tem estado bastante ativo na defesa da necessidade de constituição de um “exército europeu”, a que a Espanha mostrou simpatia e desejo de participar, precisamente no momento em que em foi atingida a difícil etapa de haver acordo unanime sobre o documento da saída do RU da UE.
De facto, não podemos esquecer que, na perspetiva da segurança e defesa europeia, o Brexit significa para a UE uma perda muito significativa e indispensável do seu poder militar e do potencial tecnológico e industrial de defesa, que é preciso colmatar com a maior brevidade possível. Mas como?
Torna-se, pois, indispensável repensar o futuro da segurança e defesa europeia pós-Brexit, pelo que o debate temático, o mais alargado possível , sobre se sim ou não devemos apoiar a criação de um “exército europeu” é hoje mais necessário e oportuno do que nunca.
Para que tal debate seja realista, sério, produtivo e atempado é essencial a existência de um QGO/UE, que parece ser essa a orientação político-estratégica das decisões do supracitado Conselho de novembro de 2018.
Tendo em consideração que 22 Estados-membros são também membros da Aliança Atlântica, e que cada país só dispõe de um conjunto de forças, todas estas profundas transformações deverão ter lugar dentro do lema de complementaridade e reforço mútuo, tantas vezes anunciado e defendido em todas as Declarações Conjuntas UE-NATO, de que “uma União mais forte é uma NATO mais forte”.

Lisboa, 3 de dezembro de 2018

Augusto de Melo Correia
Associado

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1 – Nos Tratados da União Europeia desde Maastricht (1992) “(…)A política externa e de segurança comum (PESC) abrange todas as questões relativas à segurança da União, incluindo a definição gradual de uma política de defesa comum, que poderá conduzir a uma defesa comum, se o Conselho Europeu assim o decidir (Artº 24º-1 do Tratado de Lsboa-13 de dezembro de 2007)”.dotar a UE de uma capacidade para desenvolver uma ação autónoma, apoiada por forças credíveis, os meios para decidir usá-las, e a prontidão para a sua concretização em resposta a crises internacionais” .
2 – Saint-Malo Joint Declaration. Nº2“(…) the Union must have the capacity for an autonomous action, backed up by credible military forces, the means to decide to use them, and the readiness to do so(…)”.
Saint-Malo Joint Declaration. Nº3 “(….) the European Union to take decisions and approve military action where the Alliance as a whole is not engaged (…)”, “(…) the European Union will also need to have recourse to suitable military needs…pre-designated within NATO’s European pillar (…)”.
3 – De acordo com o Artº 42º do Tratado de Lisboa a PESD passou a designar-se por Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD), pelo que no presente trabalho passará a utilizar-se a expressão PCSD.
4 – Conclusões do Conselho Europeu de Colónia. Anexo III – Declaração do Conselho Europeu sobre o Reforço da Política Europeia Comum de Segurança e Defesa.
5- No Conselho Europeu de Helsínquia foi estabelecido o objetivo global militar 2003 (HLG-2003), que consiste em os Estados-Membros, até 2003, estarem aptos a posicionarem, no prazo de 60 dias e manterem pelo menos durante um ano, forças militares de 50-60.000 homens capazes de desempenhar toda a gama de missões Petersberg. Foram ainda criadas no Conselho novos órgãos e estruturas políticas e militares que permitem à UE assegurar a necessária orientação política e direção estratégica.
As missões de Petersberg foram adotadas no Conselho ministerial da UEO realizado em Petersberg (Alemanha), em junho de 1992, e abrangem as seguintes missões que podem ser postas à disposição da UEO, NATO e UE: (I) missões humanitárias ou de evacuação dos cidadãos nacionais; (ii) missões de prevenção de conflitos e de manutenção da paz; (iii) missões de forças de combate para a gestão de crises, incluindo operações de restabelecimento da paz; (iv) ações conjuntas em matéria de desarmamento; (v) missões de aconselhamento e assistência em matéria militar; (vi) operações de estabilização no termo dos conflitos.
As chamadas missões de Petersberg passaram a fazer parte dos Tratados da União Europeia (ex-artigo 17º, tendo sido ampliadas pelo artigo 43º-1do Tratado de Lisboa).
6 – No Conselho Europeu da Feira foi estabelecido o objetivo global civil 2003 (HLG 2003-Cvil), em que os Estados-Membros disponibilizam 5.000 polícias até 2003, para missões internacionais no âmbito das missões de prevenção de conflitos e gestão de crises, com a capacidade de posicionar, em 30 dias, um efetivo de 1.000 agentes polícias.
7 – Comité Político e de Segurança (COPS), Comité Militar da UE (CMUE) e Estado-Maior da UE (EMUE.
Foram, contudo, omissos quanto ao estabelecimento de uma estrutura permanente de planeamento, comando e controlo operacional militar.
8 – França, Alemanha, Bélgica e Luxemburgo (países conhecidos como produtores de chocolate).
9 – Artigo 5º do Tratado de Washington, Artigo V do Tratado de Bruxelas.
10 – O Acordo de Berlim Plus foi assinado em 17 de março de 2003, no quadro da cooperação UE-NATO, consistindo na possibilidade de a UE recorrer aos meios e capacidades da NATO, incluindo o seu quartel-general de operações do SHAPE. A operação Concórdia, na ex-República Jugoslava da Macedónia (2003), e a operação Althea, na Bósnia Herzgovina (2004), foram as únicas operações da UE (até ao momento) que utilizaram o Acordo Berlim Plus. Com a entrada de Chipre na UE (1maio2004) as relações políticas UE-NATO alteraram-se tendo sido dificultado o recurso ao Acordo Berlim Plus, por oposição sistemática da Turquia.
11 – Até ao momento foram identificados 5 QGO nacionais que podem ser disponibilizados para o exercício do planeamento, comando e controlo operacional das missões lançadas pela UE (França-Mont Valerién, Reino Unido-Northwood, Alemanha- Potsdam, Itália-Roma, Grécia-Larissa). O comando das operações Artemis RDCongo, EUFOR RDCongo, EUFOR TCHAD/RCA, EUNAVFOR/Atalanta e EUFOR RCA, foi exercido, respetivamente, pelos seguintes QGO nacionais: Mont-Valerién, Potsdam, Mont-Valerién, Northwood e Larissa.
Mais recentemente (2018), a UE passou a contar com um 6º QGO nacional em Rota-Espanha, com vocação naval para substituir o QGO de Northwood, aquando da efetivação do Brexit.
12 – Associado ao conceito de Agrupamento Tático (Battlegroup), aprovado em 2004, o Centro de Operações da UE foi criado com o objetivo de assegurar o lançamento, planeamento e condução operacional de missões de resposta rápida, sobretudo quando as missões forem eminentemente de carácter civil-militar e não tiver sido identificado e disponibilizado nenhum QGO nacional. Permanentemente disponível e pronto a funcionar junto do EMUE, será ativado por decisão do Conselho, com recurso a pessoal do EMUE, e Estados- membros (augmentees).
13 – Decisão 2012/173/PESC, de 23 de março de 2012.
14 – Operação Atalanta (EUNAVFOR Atalanta), EUTM Somália e EUCAP NESTOR (missão civil para reforço das capacidades navais regionais).
15 – Migrações descontroladas, terrorismo transnacional, ameaças híbridas, cibersegurança, segurança energética, maior assertividade da Rússia….
16 – O recurso ao Acordo Berlim Plus tornou-se praticamente inoperante, obsoleto e inadequado. Por outro lado, os QGO nacionais, devido à sua natureza não permanente e pequena dimensão, constituíam de facto um obstáculo ao normal desenvolvimento das atividades militares da UE. Por sua vez, a ativação de um QGO nacional, conjuntamente com a designação de um comandante operacional e o treino indispensável do pessoal nacional destacado, é um processo muito demorado que não se compadece com a dinâmica da rápida evolução tática no terreno. Além disso, a distância entre o QGO nacional e o centro de decisão estratégica em Bruxelas, complicava as comunicações e dificultava a coordenação.
17 – O RU liderou desde sempre a oposição às propostas de criação de um QGO/UE para o planeamento operacional e conduta das operações militares lançadas no quadro da PCSD. Neste sentido, o Brexit poderá facilitar o caminho, lento mas progressivo, para a criação de um verdadeiro QGO/UE, naturalmente em complementaridade e reforço mútuo com a NATO. Contudo, o Brexit poderá significar também uma perda de 20% para a UE, em termos de capacidades militares e de potencial tecnológico-industrial de defesa.
18 – À semelhança de uma outra estrutura já existente no Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE) para o planeamento e conduta de missões civis (CPCC).
19 -Trata-se de 3 missões militares que apoiam a nação hospedeira em treino e aconselhamento: EUTM Somália, EUTM Mali e EUTM RCA.
20 – A título de exemplo informa-se que a estrutura civil semelhante ao MPCC existente no SEAE, que se designa por CPCC, conta com um quadro de pessoal constituído por 75 pessoas para apoiarem 9 missões, o que dá 8-10 pessoas por missão. Curiosamente, no que respeita ao MPCC, que conta com 30 pessoas para apoiar 3 missões, também se chega a um rácio mais ou menos semelhante ao do CPCC.
Seria do maior interesse nacional que Portugal participasse desde o início no novo MPCC, com pessoal destacado nacional devidamente qualificado, treinado e exercitado.
21 – É notória a “falta de meios à disposição da UE e as conferências de geração de forças, penosamente prolongadas, sobre a constituição de uma força para as operações militares, num momento em que nos confrontamos com redundância de capacidades e de pessoal…” (Nº 23 do Projeto de Relatório da Comissão de Assuntos Externos do Parlamento Europeu 2010/2299 (INI), de 17/02/2011).
Por exemplo, durante a fase de preparação para o lançamento da operação EUFOR TCHAD/RCA, em 16 de outubro de 2007, já com o QGO identificado, disponibilizado e em pleno funcionamento, foram necessárias várias e penosas conferências de geração de forças para levantar uma força militar de apenas 3.700 homens (o núcleo central da força foi guarnecido pela França e grande parte dos helicópteros de transporte tático foram disponibilizados pela Rússia, que participou pela primeira vez numa operação militar PESD). Assim, esta operação que, segundo a Resolução do Conselho de Segurança da ONU (Resolução 1778/2007), tinha um carácter humanitário urgente como “bridging operation”, levou várias semanas até à aprovação dos principais documentos de planeamento operacional (Conceito de Operações-CONOPS e Plano de Operações-OPLAN), não por falta de um QGO e do respetivo comandante, mas sim por falta de vontade política que se reflete na dificuldade crónica de disponibilização de meios por parte dos Estados- membros. E o mais espantoso é que os meios mais críticos (helicópteros) existiam em número mais do que suficiente nos Estados- membros, que ou não os colocaram à disposição da UE ou puseram imensas limitações à sua utilização operacional (caveats), que têm a ver com as diferentes culturas estratégicas dos Estados-membros envolvidos.
22 – 13978/18, CFSP/PESC/1017, de 19 de novembro de 2018
23 – Uma das características fundamentais do BG é a sua flexibilidade e adaptabilidade a diversos tipo de missão (taylor made), tendo uma dimensão média de 1500-2000 militares, não ultrapassando os 2500 se considerarmos o indispensável apoio de fogos e apoio aéreo.

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